quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

LUTERO E OS CAMPONESES II

Vez por outra encontro alguém se esforçando em defender Lutero contra a acusação de que escreveu palavras duras demais contra os camponeses revoltosos. Relendo, "A Refoma", de Will Durant, me deparei com esta citação:
Um rebelde não é digno de receber resposta com argumentos, pois não os aceita. A resposta para uma boca assim é um soco no nariz para sangrar. Os camponeses não querem ouvir... seus ouvidos tem de ser abertos à bala, até que as cabeças lhe saltem dos ombros. Discípulos assim, precisam de varinhas assim. Aquele que não quer ouvir a Palavra de Deus quando é dita com bondade tem de ouvir o carrasco quando chegar com o machado... Não quero ouvir nem saber nada de misericórdia e sim dar atenção à vontade de Deus em Sua Palavra... Saul não pecou ao demonstrar misericórdia para com Amalec quando deixou de executar a ira de Deus que lhe fora ordenada?  (DURANT, Will. A Reforma, p. 330). 
É verdade que Lutero era um sujeito impulsivo, "sangue quente"; que os camponeses estavam passando dos limites, mas cá entre nós, não dá para defender o reformador alemão! 

5 comentários:

  1. Longe de mim querer defender o Lutero, brother Jones, até pelo que já li dele a respeito dos camponeses, mas com tantas declarações espúrias atribuídas a ele, a gente fica meio desconfiado. No texto referido por Durant acima, eu estranhei o trecho "seus ouvidos tem de ser abertos à bala", porque imagino que essa figura não era familiar a uma pessoa do começo do séc. XVI. Fui pesquisar e os primeiros mosquetões só foram usados no fim do séc. XVI e mesmo assim muito limitadamente. Ainda que fosse difícil fazer a analogia para a época, mesmo os canhões ainda eram bastante incipientes a ponto de criar a metáfora. Não consigo imaginar, portanto, que ele tivesse utilizado essa imagem. Provavelmente disse coisas piores que isso, mas até uma melhor análise desse texto, acho que poderíamos dar a Lutero o benefício da dúvida sobre sua autenticidade.
    Abraço!

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  2. Sim Hélio, também estranhei a expressão "abertos à bala". Fiz uma pesquisa antes de citar o trecho e descobri que a pólvora chegou à Europa no século XIII, trazida do Oriente. No final daquele século, os canhões já causavam estragos.

    De qualquer forma, é possível que Durant ou o tradutor tenham se equivocado na tradução do original (na verdade acho bem provável que isso tenha ocorrido). Durant cita a fonte do trecho citado: Lutero, Works, IV, 261-72.

    É bom ter leitores atentos.

    Abraço!

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  3. Oi, Jones!

    Fui consultar meus alfarrábios luteranos e encontrei essa pérola no vol. 6 das Obras Selecionadas publicadas pela Sinodal (p. 344). Curioso que este parágrafo está dentro de uma defesa que Lutero faz de sua dureza contra os camponeses, o que já lhe rendia críticas, digamos, tanto da "direita" como da "esquerda" da época, anacronicamente falando:

    "Se essa resposta lhes parece demasiadamente cruel, se sustentam que isso seria um discurso violento e uma forma de calar a boca à força, eu lhes digo que é isso mesmo: um rebelde não merece que se lhe responda com argumento racional, pois de qualquer forma não o aceita. É preciso responder com o punho a tais pessoas, até que lhes corra sangue pelo nariz. Os camponeses também não quiseram ouvir nada, não aceitaram que se lhes dissesse algo. Então foi preciso abrir-lhes os ouvidos a bala de mosquete, que lhes fizessem voar a cabeça pelos ares. Uma vara assim é adequada para esse tipo de aluno. Quem não quer ouvir a palavra de Deus de boa vontade, terá que ouvir o carrasco com o machado. Se alegam que nessa questão eu estaria faltando com bondade e misericórdia, eu respondo: misericórdia por misericórdia, estamos falando da palavra de Deus, que quer ver o rei respeitado e os rebeldes arruinados, e nem por isso deixa de ser tão misericordioso como nós somos."

    O Luterão não era flor que se cheirasse, mas também imagino que a revolta campesina mexeu com as estruturas dele ao perceber que a Reforma estava por um fio. Bateu um desespero geral e ele deu vazão ao pior lado dele, essa miséria humana que de vez em quando vem à tona. Mancada feia, fazer o quê?

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  4. Esqueci: Lutero já sabia o que uma bala de mosquete era capaz de fazer... rsrs

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  5. Pois é, achei mais crível um erro de tradução que um erro de citação. Will Durant é muito cuidadoso. É um historiador sério. São quase mil páginas só sobre Reforma.

    Mas há no livro citações favoráveis a Lutero. Eu é que insisto em ficar mostrando os podres, rs,rs.

    Obrigado por contribuir com o tópico.

    Abraços!

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