terça-feira, 30 de maio de 2017

QUERUBINS EM RUAS DE FOGO

A Bíblia hebraica apresenta os querubins com a função de guardiões (Gn 3,24; Ez 28,16) e montaria de Javé (Sl 18,10). Dotados de asas e corpo de animais, têm aparência semelhante aos lamassus assírios/persas e esfinges egípcias (Ez 1;10).

Na iconografia do Antigo Oriente Próximo aparecem ilustrando tronos de reis/divindades. Isso explica a fórmula: “Jávé se assenta sobre os querubins” (2Sm 6,2). Não eram vistos como “anjos” (mensageiros celestes), mas como guardiões. Não eram percebidos como meninos peladinhos e gordinhos alados (como na iconografia renascentista), mas seres com aparência imponente, intimidadora.

Um detalhe que recentemente chamou minha atenção aparece em textos que apresentam os querubins vivendo/voando/caminhando sobre pedras/brasas de fogo. Eis os textos:

Sl 18,10.12 cavalgou em querubim e voou, planando sobre as asas do vento. [...] à sua frente um clarão inflamava GRANIZO E BRASAS DE FOGO.

Ez 1,13 No meio dos seres viventes havia uma coisa semelhante a ARDENTES BRASAS DE FOGO...

Ez 10,2 ...vai por entre as rodas giradoras, até debaixo do querubim, enche as tuas mãos de BRASAS ACESAS DENTRE OS QUERUBINS.

Ez 28,16 “O querubim da guarda te expulsou DO MEIO DAS PEDRAS AFOGUEADAS”.

Na queda do rei de Tito, descrita em Ez 28 com cores da mitologia oriental antiga, o rei é destruído com um fogo, que o consome por completo: “fiz sair do meio de ti um fogo, que te consumiu a ti, e te tornei em cinza sobre a terra” (28,18).

Questões que me inquietam: seria este o fogo das pedras sob aqueles querubins que agora não protegem mais o rei de Tiro? A leitura correta é rei de Tiro “foi colocado como um querubim” (texto hebraico), ou “junto a um querubim” (texto grego)? Foi expulso “por Javé” (texto hebraico) ou “pelo querubim” (texto grego)? Por que o rei de Tiro é apresentado de forma tão exaltada (trata-se de um caso singular)? Há registros contendo descrições de querubins andando sobre brasas em textos extrabíblicos?



Jones F. Mendonça

sexta-feira, 26 de maio de 2017

A RESSURREIÇÃO DE BAAL E ASHERAH

Um grupo (ainda pequeno) de judeus de Israel está resgatando e incorporando elementos da antiga religião ugarítica e cananeia em suas práticas diárias. Alegam – citando Dt 33,2 – que Javé é uma divindade não israelita e que por isso deve ser rejeitada.

O fenômeno do neopaganismo no Israel moderno é discutido na obra: “Canaanite Reconstructionism Among Contemporary Israeli Pagans”, escrito por Shai Feraro.

Sobre as origens midianitas de Javé, vale conferir “A origem de Javé” (Thomas Römer,  Paulus, 2016).

Leia mais aqui.



Jones F. Mendonça

quinta-feira, 25 de maio de 2017

SIMONE DE BEAUVOIR E A AUTOMUTILAÇÃO FEMININA

Engatei a quinta marcha na leitura de “O segundo sexo” da filósofa francesa Simone de Beauvoir. No segundo volume Simone dedica-se a falar a respeito de alguns conflitos que atormentam meninas na fase da adolescência, sobretudo no período das primeiras menstruações.

Embora as automutilações sejam vistas por muitas pessoas como um fenômeno contemporâneo, Simone relata em detalhes os diversos casos com os quais teve contato ao longo de sua vida (o livro foi escrito na década de 40!). Para a autora muitos dos casos têm origem na negação da sexualidade. Eis o que ela diz:
Essas práticas sadomasoquistas são, ao mesmo tempo, uma antecipação da experiência sexual e uma revolta contra ela; é preciso, suportando essas provações, enrijecer-se conta toda a provação possível e assim torná-las toda anóditas [=menos dolorosas], inclusive na noite nupcial.
Difícil saber se Simone estava certa ou não. Certo mesmo é que pesquisas feitas por Robert Rosenthal, na década de 70, revelaram que 60% das inscrições corporais ocorrem no momento das menstruações.

Sobre a prática da automutilação na Idade Média, sob o manto da piedade, vale ler: “Papas y Putas: Historia Sexual del Cristianismo”, de Karlheinz Deschner e Oliver Tad.



Jones F. Mendonça

terça-feira, 23 de maio de 2017

A CONQUISTA DE JERUSALÉM: JUDÁ, JOSUÉ OU DAVI?

De acordo com 2Sm 5,4-5 Davi começou a reinar em Hebron aos 30 anos. Seu reinado nessa cidade teria durado 7 anos. Depois mudou sua capital para Jerusalém, cidade tomada dos jebuseus que acomodou sua corte pelos próximos 33 anos.

Curioso é que o autor de 1Sm 17,54 supõe que Jerusalém já era uma cidade israelita  na época de Saul: 
Davi apanhou a cabeça do filisteu e a levou a Jerusalém, e as suas armas ele as levou para a sua tenda.
Confuso, não?

Para saber mais sobre o assunto, leia o artigo “Conquest of Jerusalem in the Bible: When and Who?”, publicado no The Torah e escrito pelo rabino Dr. Zev Farber.


Jones F. Mendonça

quinta-feira, 18 de maio de 2017

COLOFÃO E CONTRADIÇÃO EM JÓ

Jó 31,40 geralmente é traduzido como “encerraram-se as palavras de Jó” (o personagem só volta a falar em 40,3 num diálogo com Javé). O verso não é uma fala de Jó, mas uma interferência do redator (uma espécie de colofão). Curioso é que o verbo traduzido por “acabaram-se” (tamam) permite pelo menos duas traduções diferentes:

1. PERFEITAS [foram] as palavras de Jó (como em Jó 22,3;Sl, 19,13; 2Sm 22,26);
2. ANIQUILADAS [foram] as palavras de Jó (como em Jr 14,15; Sl 73,19).

A tradução “perfeitas foram as palavras de Jó” concorda com a fala de Javé em 42,7 “porque não falastes corretamente de mim, como o fez meu servo Jó”.

A tradução “aniquiladas foram as palavras de Jó” concorda com a fala de Javé em 38,1-40,2: “Quem é esse que obscurece meus desígnios...”.

O artigo completo, por Thomas M. Bolin, pode ser lido aqui:



Jones F. Mendonça